Remendar o fio ancestral - Reflexão sobre o Capítulo 14 do Dao De Jing
- Raquel Silva
- 23 de fev.
- 3 min de leitura
Atualizado: 24 de fev.
No décimo quarto capítulo o Velho Mestre ensina:
Olha-se para ele e não se vê;
chama-se sem forma.
Escuta-o e não é ouvido;
é chamado de sem som.
Tenta agarrá-lo e não pode ser segurado;
chama-se intangível.
Estes três são impossíveis de compreender
e por isso estão unidos.
A superfície não é brilhante.
O fundo não é escuro.
Não pode ser agarrado ou nomeado.
Regressa à origem (wuji).
É chamada a forma sem forma,
a imagem do que não tem imagem.
É vaga e indistinta.
Olhando para ela,
não se vê o seu início,
o seu fim não pode ser seguido.
Mantém-te firme no antigo caminho do Tao
flui com o aqui e agora.
Conhecer o início ancestral das coisas
é conhecer a essência do Tao.
O Velho Mestre, mais uma vez, tenta usar palavras para descrever o que está além da linguagem. O Dao não pode ser visto, ouvido ou apreendido pelo pensamento racional. Ele escapa aos sentidos porque é Uno e abrange todas as coisas. Não há separação entre ele e o mundo, entre nós e o Todo.
É-nos lembrado que tentar compreender o Dao com a mente não só é impossível, como nos afasta dele. Ele é a forma sem forma, a imagem do sem imagem. A única maneira de o experimentar é recuar a um estado de consciência anterior à linguagem, onde o real não foi ainda reduzido a conceitos e separações artificiais.
O Regresso à Unidade
Como já discutimos, a humanidade afastou-se do Dao ao confiar excessivamente na separação entre as coisas. Como escreve Zhuangzi:
O conhecimento dos antigos sábios era vasto e profundo, pois conheciam o mundo antes das distinções.
Quando dividimos o mundo em categorias e conceitos, criamos a ilusão de separação. Mas a verdade é que somos apenas diferentes expressões do mesmo fio invisível, aquele que a sabedoria indiana chama de sutratma. Como explica Lúcia Helena Galvão:
Há um colar com várias contas de inúmeras formas, ligadas por um fio invisível. Esse fio representa a realidade última, a unidade essencial de todas as coisas.
Este fio liga-nos ao passado ancestral e ao futuro intemporal. É a corrente invisível do Dao, que flui por dentro de tudo, mesmo que não possamos agarrá-lo. No entanto, pela percepção da separação, desligamo-nos deste fio. Como alerta Solala Towler:
Se a mente estiver cheia de pensamentos negativos, o espírito enfraquece e murcha.
Assim, o que precisamos fazer é reconectar-nos ao fio. Mas como?
A Ligação entre Mente e Coração
Na sociedade moderna, desligámos a mente do coração. Fazemos uma coisa enquanto pensamos noutra. Distraídas. Fragmentadas. Perdemos energia vital (Qi) porque não estamos alinhadas com a nossa essência. Para voltar ao Dao, precisamos de unir a mente ao coração.
Curiosamente, a ciência moderna tem vindo a confirmar esta antiga sabedoria. Estudos do HeartMath Institute demonstram que:
As emoções e pensamentos de cada pessoa geram campos energéticos.
O coração emite um campo eletromagnético que influencia o cérebro e o corpo.
Quando cultivamos emoções positivas, o nosso sistema entra em coerência, promovendo bem-estar.
A ciência comprova o que as pessoas sábias da antiguidade já sabiam: quando estamos alinhadas emocionalmente, sentimos menos separação e mais unidade.
Mas como podemos aplicar isto na prática?
Prática: Ligação ao Coração
Respire profundamente e sinta o seu coração.
Evoque sentimentos de amor e apreço.
Visualize um fio invisível a ligá-la a todas as pessoas e seres vivos.
Sinta essa ligação crescer.
Envie energia positiva a alguém de quem se sente separada.
Quanto mais praticamos esta ligação ao coração, mais dissolvemos os muros da separação e entramos no fluxo natural do Dao. Como diz Laozi, “seguir o antigo caminho do Dao é viver plenamente o presente.” Se queremos reencontrar o Dao, precisamos apenas de estar aqui, agora.
(Pode assistir ao resumo desta publicação aqui!)
Bibliografia
Chuang Tse (1992). Capítulos Interiores. Editorial Estampa. [Tradução António Manuel Guedes de Campos, sobre a versão em língua inglesa de Gia-Fu Feng e Jane English]
Lao Tse (2022). Tao Te King - O livro do Caminho e da Virtude. Nova Acrópole [Tradução e adaptação de José Ramos e Graciete Silva Nogueira a partir das traduções de Stanslas Julien e James Legge; Comentários de Lúcia Helena Galvão Maya].
Towler, S. (2016). Practicing the Tao Te Ching - 81 Steps in the Way. Sounds True.
Towler, S. (2019). Tao-Te King : uma jornada para o caminho perfeito : lições práticas
sobre o taoismo. Editora Pensamento-Cultrix [prefácio de Chungliang Al Huang; tradução Claudia Gerpe Duarte e Eduardo Gerpe Duarte].
Texto revisto com OpenAI: ChatGPT [Software]. https://openai.com
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